Resenha escrita via whatsapp pelo grupo de pesquisa
POESIA E TRANSDISCIPLINARIDADE: A VOCOPERFORMANCE para o texto “Nalgum lugar entre o
experimentalismo e a canção popular: as cartas de Paulo Leminski a Régis”, de Marcelo
Sandmann.
Marcelo
Sandmann lê criticamente as cartas de Paulo Leminski e Regis Bonvincino, entre
1976 e 1981, e reflete sobre a trajetória de Leminski neste momento
politicamente conturbado do país. O poeta vanguardista, músico, letrista e
admirador de Torquato Neto começou a publicação de seus poemas em diversas
revistas numa época difícil. Sandmann aborda também o livro de prosa
experimental de Paulo Leminski Catatau,
publicado em 1975.
As cartas documentam
preocupações artísticas e o dia-a-dia do escritor que percorreu o complexo
caminho que leva da vanguarda experimental à canção popular. Enfatiza-se
Caetano Veloso e Chico Buarque como os grandes de sua era. Fala-se também do
uso indistinto de "poeta" e também de "cancionista". A
diferença não se refere apenas pelo "suporte", mas sim tem a ver com
a articulação entre texto e música; isso ocorre quando tratamos de canção. Destaque-se
a canção de Leminski “Verdura” cantada por Caetano no disco Outras palavras.
Fica sugerido que a
aproximação de Paulo Leminski com a contracultura, que o distinguia de outros
poetas experimentalistas, foi que o instigou a pensar além do concretismo. O
legado concretista é um problema para os poetas mais novos. Nas cartas Leminski
avalia o Catatau, submerso no
movimento de seu mestre Décio Pignatari. Leminski passa a querer outro tipo de
experimentação da palavra/ linguagem. Uma experiência ligada à paixão pelo novo
que não precisa se justificar. A "originalidade" e a
"novidade" são postas a prova.
É
interessante ver como Leminski se descola da vanguarda para dar novos caminhos
a sua poesia. Sobre isso, "a comunicação surge portanto como um critério
importante: ‘quero fazer uma poesia que as pessoas entenda,. / q não precise
dar de brinde um tratado sobre Gestalt ou uma tese de Jakobson sobre as
estruturas subliminares dos anagramas paronomásticos’ É com ironia que o poeta
vai se referir ao aparato teórico-crítico que costuma acompanhar a práxis
poética concretista, fazendo de sua fruição algo restrito aos iniciados"
(p. 131). É a partir dessa crítica à uma poesia que julga ser para poucos, e a
procura de uma comunicação mais abrangente que Leminski acrescenta dois novos
ingredientes à sua poética, somando-se à experiência com o concretismo e a
prosa experimental: a publicidade e a canção popular. Não que houvesse aí uma
disjunção, uma escolha em detrimento de outra, mas, como Sandmann frisa,
"a publicidade vai surgir como uma opção profissional para Leminski antes
de tudo. Portanto, é com um passo atrás que se deve ler a equação que aproxima
canção e publicidade e as confronta com poesia, como se tratasse simplesmente
de uma opção desinteressada por esta ou aquela linguagem" (p. 133).
Leminski
flertava com uma poesia que aproximasse, de uma forma radical, arte e vida. Ele
tinha no mundo da canção uma paixão. Leminski cita Vinicius de Morais que ganha
prestígio com suas poesias publicadas em livros e migra, logo depois, para o
campo da canção. Leminski queria cruzar fronteiras do livro e do disco, e chegou
a fazer canções, além de ter muitos poemas cantados.
É importante destacar
que Leminski estava “reagindo contra o controle racional excessivo, o
construtivismo, o anti-subjetivismo, o decoro intelectual e erudito,
entrevistos como elementos capitais da atitude concretista”. Em outra carta,
incitava o “desregramento contracultural” (p. 128).
O texto de Sandmann é
uma boa introdução à obra de Paulo Leminski enquanto figura pós-moderna e
"dilemática", conciliação das esferas antípodas do pop e do erudito,
grosso modo. Leminski apresenta uma espécie de rebeldia que o rejuvenesce.
Neste sentido, o corpo de sua obra emite uma aura muito parecida com aquela que
envolvia os poetas beatniks ou a trajetória de um Bob Dylan ou Lou Reed. Porém,
o trabalho de linguagem de Leminski, interessantemente, passou por
transformações que partem da participação em uma vanguarda formalista, da
publicação de um joyceano romance que atordoou mesmo os mais sofisticados
críticos de sua época, passando pelo questionamento da linguagem hermética de
iniciados, da tendência prescritiva e do enclausuramento burguês das vanguardas
poéticas, até chegar ao lirismo e à ironia que os mais desatentos poderiam
chamar de diluição e massificação.
SANDMANN, Marcelo. “Nalgum lugar
entre o experimentalismo e a canção popular: as cartas de Paulo Leminski a
Régis”. In: Revista
Letras, Curitiba, n. 52, p. 121-141,
jul-dez, 1999, Editora da UFPR.
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