Desde o Projeto 365 Canções (2010), o desafio é ser e estar à escuta dos cancionistas do Brasil, suas vocoperformances; e mergulhar nas experiências poéticas de seus sujeitos cancionais sirênicos.
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18 fevereiro 2024
Ao amigo que não me salvou a vida
Paralela às discussões teóricas sobre autoficção, o livro AO AMIGO QUE NÃO ME SALVOU A VIDA, de Hervé Guibert é o registro tocante e interessado dos anos 1980 em Paris, período de descobrimento da aids, doença que aturdiu e matou muita gente. Jornalista e fotógrafo, Guibert maneja as imagens líricas e subversivas da escrita, seduzindo quem ler. "Sim, posso escrever, e esta sem dúvida é minha loucura, dou mais importância a meu livro do que a minha vida; eu não desistiria de meu livro para preservar minha vida, isso será o mais difícil de fazer as pessoas acreditarem e entenderem", lemos em um dos muitos momentos metalinguísticos do texto. "A obra é o exorcismo da impotência", lemos também. Como registrar e impotência? Talvez seja essa a pergunta que move o livro. Impotência diante da doença, diante do "rosto descarnado" que o espelho reflete, diante do abandono de um amigo que poderia ter ajudado e não ajudou. A narração ao estilo de um diário romanceado termina pouco tempo antes da morte do autor. Sob pseudônimos (ou heterônimos?), Michel Foucault e Roland Barthes, amigos de Guibert, também são personagens de uma narrativa em que a homossexualidade pode, enfim, transparecer: "havia uma certeza de que para além da amizade estávamos ligados por um destino tanalógico comum". Se Cazuza cantou "eu vi a cara da morte e ela estava viva", AO AMIGO QUE NÃO ME SALVOU A VIDA registra essa convivência. "Este livro que relata minha fadiga me faz esquecê-la e, ao mesmo tempo, cada frase arrancada de meu cérebro, ameaçado pela intrusão do vírus assim que a pequena barreira linfática ceder, me dá ainda mais vontade de cerrar as pálpebras", lê-se.
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