Pesquisar canções e/ou artistas

12 maio 2024

O belo caminho

Em O BELO CAMINHO Gary P. Leupp apresenta a "história da homossexualidade no Japão". É muito interessante perceber o que a "ocidentalização" do Japão fez com os costumes daquele país que nem o termo "homossexual" (ou parecido) usava, dada a diversidade de práticas e jogos eróticos possíveis entre pessoas do mesmo sexo, notadamente, homens. E nisso as culturas se irmanam, no patriarcado, na brotheragem que incensa de hipocrisia a moral e a ética. O rico trabalho de pesquisa em arquivos de documentos e imagens faz do trabalho de Leupp uma obra importante e rara, por desvelar de modo tão direto essa história pouco conhecida. Afinal, "é comum sociedades atribuírem a gênese da sua homossexualidade ao estrangeiro: os hebreus associavam-na às culturas pagãs egípcias e canaanitas; os gregos imputavam sua pederastia aos persas; os europeus medievais consideravam a sodomia um pecadilho árabe trazido pelos Cruzados; e os ingleses renascentistas estavam convictos que o 'vício inominável' chegara às ilhas por meio de, dependendo da conjuntura das suas relações internacionais, Castela, Itália, Turquia ou França", anota Leupp, sob tradução de Diogo Kaupatez. Mas "como explicar o surgimento e a difusão de uma cultura nanshoku monástica, tamanha a fobia homossexual dos textos budistas continentais?", pergunta-se o autor de O BELO CAMINHO. Nanshoku é termo utilizado para referir-se a relações homossexuais entre homens, traduzido como “cores masculinas”. O livro percorre respostas, desde a "tolerância social" até a "construção de gênero", passando mesmo pela "comercialização do nanshoku", presente nas tradições monástica, militar, burguesa. Leupp mostra como "o conceito de nanshoku-zuki cedeu lugar ao alemão urning, indivíduo que padecia de desordem psicológica. Assim, os homens se tornaram pouco propensos a conhecer, e muito menos experimentar, o prazer homossexual". O desdobramento foi a marginalização. E nisso o livro conta bastante a história do desejo sexual também em nosso cultura.

05 maio 2024

Fremosos cantares


O livro FREMOSOS CANTARES é material primoroso para quem quer imaginar com rigor e prazer o som da lírica medieval galego-portuguesa, braço e berço importante de nossa lírica. A professora Lênia Márcia Mongelli aciona o gaio saber sonoro de uma poesia que se realizava na voz, no canto, na presença física de quem cantava e de quem ouvia. Em relação à poesia trovadoresca, é sempre importante destacar o caráter coletivo das cantigas e a tensão entre o indivíduo e sua subjetividade. Da interação entre música, poesia e performance, surgia a formação de um "eu coletivo", de um "corpo místico", nas palavras do professor João Adolfo Hansen, ao pensar as letras coloniais brasileiras, por exemplo. Algo que nos é difícil acessar hoje, tamanha a nossa individuação. Fato é que, como se sabe, o virtuosismo era elemento constitutivo do poeta trovador, o que, por vezes permitia certa exteriorização dos estados de espírito, conforme observado por Mongelli. Para a autora, O lirismo trovadoresco galego-português não é, evidentemente, uma poesia 'confessional'. Não se pode esperar encontrar nela um 'eu' individual expresso com a densidade introspectiva romântica ou com o nível de verticalidade psicológica dos simbolistas ou com a consciência moderna de que fazer é revelar. Contudo, é preciso matizar os limites do chamado 'eu coletivo' medieval". Antologizando, comentando, corporificando, cotejando e singularizando vozes de um coro (hoje) mudo de poemas da vasta poesia desse período, FREMOSOS CANTARES abre nossos ouvidos.