Basicamente, a canção é o equilíbrio entre um texto (palavra) e uma melodia (vocal e/ou instrumental). O equilíbrio deve se dar na performance do cancionista - que nem sempre é o compositor da canção.
É na performance que o cancionista imprime o efeito de real: a sensação - no ouvinte - de naturalidade, de que aquelas palavras só podem ser ditas (entoadas) da forma ouvida. O cancionista dá sentido a sons, ritmos, sentimentos e experiências que estão "soltas" no mundo.
Cantar é sempre cantar a vida: afirmar a existência de quem canta. O sujeito de "Ele me lê", de Ana Cláudia Lomelino, ao apontar o gesto do outro - "ele me lê" - está chamando atenção para a surpresa de ser lido pelo outro.
Guardada no disco Tono (2010), o verso "Ele me lê" mais parece uma palavra única - êlimilê - vinda de alguma língua afro: nagô, iorubá, bantu. Para isso, age o modo de pronúncia de Ana: gerador de um delicioso palíndromo. Além disso a melodia mântrica, ampliada pela repetição ad infinitum do verso-título, a conjunção dos sons /l/ e /m/ e o som palindromático reforçam a gestualidade ritual da canção.
O sujeito parece aprofundar-se mais e melhor em si, a cada nova repetição: circularidade cartática. Isso, aliado ao som da banda Tono, que produz uma ciranda encantatória entre sintetizadores e percussão, faz de "Ele me lê" uma bela espiral de fumaça sonora.
A certa altura, o verso que até então vinha se dobrando para dentro de si desdobra-se para fora e entra o coro: "Ele te lê". Eis o ápice da vontade do sujeito, o êxtase ritualístico: o reconhecimento daquilo que ele havia dito.
Ana Claudia Lomelino é a abelhinha que faz zum-zum no mel: engendra o sujeito da canção na voz. Voz que dá espaço ao som instrumental quando a mensagem é restaurada: agora não é mais "ele" que lê o sujeito, há uma terceira personagem - o coro - que ouve, lê e canta (assina) o que o sujeito cantou: "ele me lê".
Cantar é sempre cantar a vida: afirmar a existência de quem canta. O sujeito de "Ele me lê", de Ana Cláudia Lomelino, ao apontar o gesto do outro - "ele me lê" - está chamando atenção para a surpresa de ser lido pelo outro.
Guardada no disco Tono (2010), o verso "Ele me lê" mais parece uma palavra única - êlimilê - vinda de alguma língua afro: nagô, iorubá, bantu. Para isso, age o modo de pronúncia de Ana: gerador de um delicioso palíndromo. Além disso a melodia mântrica, ampliada pela repetição ad infinitum do verso-título, a conjunção dos sons /l/ e /m/ e o som palindromático reforçam a gestualidade ritual da canção.
O sujeito parece aprofundar-se mais e melhor em si, a cada nova repetição: circularidade cartática. Isso, aliado ao som da banda Tono, que produz uma ciranda encantatória entre sintetizadores e percussão, faz de "Ele me lê" uma bela espiral de fumaça sonora.
A certa altura, o verso que até então vinha se dobrando para dentro de si desdobra-se para fora e entra o coro: "Ele te lê". Eis o ápice da vontade do sujeito, o êxtase ritualístico: o reconhecimento daquilo que ele havia dito.
Ana Claudia Lomelino é a abelhinha que faz zum-zum no mel: engendra o sujeito da canção na voz. Voz que dá espaço ao som instrumental quando a mensagem é restaurada: agora não é mais "ele" que lê o sujeito, há uma terceira personagem - o coro - que ouve, lê e canta (assina) o que o sujeito cantou: "ele me lê".
***
Ele me lê
(Ana Cláudia Lomelino)
Ele me lê ele me lê ele me lê
Ele te lê ele te lê
Ele te lê
(Ana Cláudia Lomelino)
Ele me lê ele me lê ele me lê
Ele te lê ele te lê
Ele te lê
Um comentário:
Oi Leonardo,
Mto bacana seus textos! Estava cá aqui eu pensando com meus botões...Vc escreveu: "Cantar é cantar a vida: afirmar a existência de quem canta"...Substituí "existência" por "desejo" e fez bastante sentido pra mim. Quando entendo por desejo aquilo que quer permanecer sempre e por isso precisa escapar: para ser eterno. Assim, cantar é uma forma de se fazer eterno. E por isso encaixo no conceito de arte. Que tal?
abs do Grillo.
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