Desde o Projeto 365 Canções (2010), o desafio é ser e estar à escuta dos cancionistas do Brasil, suas vocoperformances; e mergulhar nas experiências poéticas de seus sujeitos cancionais sirênicos.
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09 março 2025
Oswald de Andrade mau selvagem
"Por um buraco da meia escocesa, verde e amarela, surge um pedaço caloso do meu pé velho que tanto andou". A anotação de Oswald de Andrade em seu "Diário confessional" (23/04/1951) dá conta de resumir bem o fim da trajetória de um dos mais anárquicos pensadores do século XX. Em OSWALD DE ANDRADE MAU SELVAGEM Lira Neto registra a vida e a obra desse sujeito que empreendeu o entendimento de nossa tropical melancolia. Se a biografia não revela nenhuma novidade sobre a persona satírica auto corrosiva do biografado, ela tem o mérito de passar em revista e organizar contextos e situações fundamentais para o pensamento plural de Brasil. Por exemplo, com rica pesquisa e senso de seleção, Lira Neto ajuda a entender porque a obra crítica e criativa de Oswald interessaria à Poesia Concreta, ao Teatro Oficina e à Tropicália. Há um investimento utópico (de ação!) na "pureza ingênua e [n]a revolta instintiva" da gente brasileira unindo ética e esteticamente cada um dos agentes desses movimentos. Mas Lira Neto não poupa o biografado, retratado também em suas contradições e canalhices. O que dizer do modo como Oswald tratou as mulheres com quem se relacionou? Herdeiro, Oswald penou encalacrado em dívidas; piadista, perdeu (quase) todos os amigos ao confundir "autenticidade" com grosseria; adepto do comunismo - "povo quer dizer o povo que trabalha, o povo que sofre, o povo oprimido e explorado", lutou até o fim (chegando a recorrer pessoalmente a Getúlio Vargas) para não perder privilégios de classe. Concomitantemente, o livro OSWALD DE ANDRADE MAU SELVAGEM mostra o pensador de ouvidos e olhos livres para o sambista Sinhô e para o palhaço Piolin; e de pé atrás contra o re-academicismo engendrado pelos então críticos universitários emergentes e excessivamente eurocentrados dos anos pós-Semana de 1922. Errado e errante, a obra de Oswald ainda carece de dentadas mais profundas. Pesquisas e livros como OSWALD DE ANDRADE MAU SELVAGEM é ótima leitura para quem queira devorar o antropófago cru ou cozido.
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