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22 setembro 2024

Ar de provença


Sempre que Augusto de Campos assina algo toda uma imensa tradição de poesia se movimenta junto, oxigenando o labor com (e a reflexão sobre) a palavra poética. E a relação de Augusto com a tradição tem raízes profundas na música. Por exemplo, foi de texto de canção do trovador provençal Arnaut Daniel que os poetas concretos brasileiros pinçaram e ressignificaram o termo "noigrandes" - "(...) olors de noigandres" característica de flor [de noz moscada?] cujo perfume liberta-nos do tédio [olors (perfume), enoi (tédio), gandres (do verbo gandir, libertar)]. Incorporado ao vocabulário e à prática poética, o termo deu nome à revista que Augusto, Haroldo de Campos e Décio Pignatari editaram em 1952 e ao grupo depois composto também por Ronaldo Azeredo e José Lino Grünewald. Desde então, Augusto de Campos tem desempenhado o trabalho de revocalizar (recolocar na voz; transcriar) textos que, vocais em seus contextos de criação, hoje acessamos apenas impressos nas páginas de livros raros. AR DE PROVENÇA é exemplo disso. No CD encartado ou por Código QR podemos ouvir cantos (na voz de Antoni Rossell) e oralizações (na voz de Augusto) de duas canções de Arnaut Daniel (que "adotou um modo de trovar em rimas raras, razão por que suas canções não são fáceis de entender nem de aprender"), uma de Marcabru ("temido pela sua língua, pois dele era tanto o maldizer") e uma de Bernart de Ventadorn ("pobre de nascimento (...) sabia cantar e trovar bem e tornou-se cortês e instruído") - todas traduzidas por Augusto de Campos. A bela edição que a editora Cobalto preparou para AR DE PROVENÇA reedita textos, traduções, intraduções e imagens singulares para a compreensão da poesia inventiva e experimental brasileira. Destaquem-se ainda a flauta de Valeria Bittar, a rabeca de Luiz Fiaminghi e a parceira sempre potencializadora de belezas entre Augusto e o produtor musical Cid Campos.

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