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01 outubro 2023

Uma encarnação encarnada em mim


O livro UMA ENCARNAÇÃO ENCARNADA EM MIM escrituraliza o Falatório de Stella do Patrocínio. No livro, Bruna Beber investiga os modos de assentamento da fala na escrita, sem perder de vista a tensão entre revelação poética e revelação religiosa presente na obra de Stella, para quem o mistério irrevelável está no gesto, no ato de transvalorizar a negatividade da vida que só o eu em performance (vocalizando, falando) revela. Resultado da dissertação do mestrado da autora, UMA ENCARNAÇÃO ENCARNADA EM MIM revela que Stella sobrevive na escritura, esse suporte privilegiado pela academia. (A despeito das gravações em áudio, mediadas por Carla Guagliardi e Nelly Gutmacher). Se toda audição, ou leitura é, em si, uma mediação, é esse o exercício que Bruna Beber realiza, ao iluminar a obra de Stella do Patrocínio por dentro - suas lacunas, ruídos, silêncios, mistérios, pletoras. Como estabelecer uma performance, o gesto-em-si da presença? Os riscos de defasagem e silenciamento são enormes, mas Bruna Beber permanece à escuta o tempo todo durante o ensaio, e isso é fundamental: ser com o corpus, ser "na encruza das ciências com as crenças". Se, ao que tudo indica, a poesia predominantemente oral transitou à poesia predominantemente escrita a partir do século XIII, na Itália, com o surgimento do soneto e a produção poética de Dante, a obra de Stella do Patrocínio nos lembra o eu-falante da lírica e que a voz que fala por trás da voz que fala no texto é a voz que fala no texto: uma mulher negra em primeira pessoa - "me transformei com esse falatório todinho", falou Stella. Bruna está à escuta dessa "voz que emana e constitui o corpo vivo para ressoar também não só nesse corpo vivo, mas no espaço e, consequentemente, em outros corpos", como escreve a partir de Paul Zumthor, a fim de elaborar importante método de escuta também antirracista.

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