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06 agosto 2023

Diário confessional


O melhor do DIÁRIO CONFESSIONAL de Oswald de Andrade é a autorrevisão que o autor do "Manifesto antropófago" faz de seu pensamento sobre a singularidade do Brasil: "Estou convencido de que só a Antropofagia tem razão. Leio um lindo livro de Hesnard, que foi quem introduziu Freud em França. Ele chega às portas da Antropofagia. Mas tropeça no marxismo e para" (07/05/1951). O resto é uma avalanche de tristeza pequeno-burguesa: ressentimento. Como sabemos, só a partir da montagem de "O rei da vela", feita em 1967 pelo Teatro Oficina, que se deu um dos primeiros reconhecimentos públicos da obra de Oswald. Aliada à leitura crítica dessa obra feita pelos poetas concretos, o cinema de Glauber Rocha e a Tropicália musical. Interessante observar como a crítica dos desdobramentos do marxismo une dois importantes escritores do século XX: "Até Marx, / atrelado à rubra moldura, / arrastava os grilhões da usura", escreveu Maiakóvski em "Sobre isto". Aliás, a obra crítica e irônica de Oswald conversa sobremaneira com a ética e a estética de Maiakóvski. Ambos têm o ideal comunista por base: um comunismo comunitário, coletivo, horizontal. A crítica às pessoas da sala de jantar, ocupadas em nascer e morrer, é evidente no pensamento dos dois. Isso está no cerne da obra de Oswald de Andrade, para quem "O povo no Brasil não tem sentimento de culpa (matriarcado). Na Rússia, só tem sentimento de culpa (ortodoxia patriarcal)" (01/04/1951). Grande parte do DIÁRIO CONFESSIONAL é testemunho do embate entre o pensador de olhos livres e ouvidos abertos com a urgência das coisas pequeno-burguesas, cotidianas - contas, dívidas, grana, mágoa, culpa. "Resiste / Coração de bronze", repete e repete Oswald, entre 1948 e 1954. É louvável o trabalho de organização feito por Manuel da Costa Pinto.

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