Desde o Projeto 365 Canções (2010), o desafio é ser e estar à escuta dos cancionistas do Brasil, suas vocoperformances; e mergulhar nas experiências poéticas de seus sujeitos cancionais sirênicos.
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21 dezembro 2025
Dendorí
"Dendorí que dizer 'dentro do orí', palavra iorubá que significa 'cabeça'". A primeira frase do livro de Ricardo Aleixo nos apresenta ao tempo-espaço da leitura proposta, a saber, a escritura da performance de sua "pessoa-muitas" e as pegadas da cabeça do poeta, performador, músico e artista visual. O livro pode ser lido como caderno de anotações, fixação de verbetes, diário de trabalho, profissão de fé no ofício de "zelador da palavra", exposição de sua "forma pessoal de lidar com o signo verbal em sua passagem do silêncio da página para o espaço sonoro-acústico". Nessa exposição, lemos: "Tenho feito o que posso para recuperar [...] esse impulso para 'a liberdade extrema de tudo englobar sem jamais se perder na confusão e no caos'", logo depois de Aleixo citar um trecho de "A escrita de Orfeu", de Marcel Detienne. Há momentos que iluminam o livro todo e faz a gente rever conceitos cristalizados no senso comum do debate sobre poiesis. Por exemplo: "Eu acredito em inspiração. Ao contrário de muita gente que cultiva, dicotomicamente, a ideia de que a inspiração seria uma força, uma energia, algo, enfim, que se opõe ao trabalho, eu penso que muito trabalho significa a abertura de canais criativos tão poderosos que aí surge a inspiração. Nada a ver com o que o senso comum chama de dom, mas com muito treino, muita paciência e a criação da melhor situação possível para que essa abertura perceptiva de fato aconteça". Ao relacionar inspiração a maturação, a trabalho, a treino e paciência, Aleixo reencanta conceitos e práticas, "Diante da pletora de 'técnicos' sem técnica - e sem alma - que as faculdades continuam a despejar no mercado a cada ano". Paralelo a isso, Ricardo faz revisão e exposição de conceitos criativos originais de sua obra, tais como "texto-tambor", "improvox", "vocálea", "corpografia", "vocografia", "poemanto"... "A concentração de beleza ética e estética nessas palavras reforça que "Dentro do orí sempre tem muitas pessoas". No caso, Hélio Oiticica, Lygia Clark, Lygia Pape, Paul Zumthor, Marcel Detienne, Octavio Paz, Muniz Sodré, Décio Pignatari, João Cabral, [...], Elza Soares, Guimarães Rosa, Edimilson de Almeida Pereira, Íris, Américo. Ricardo escreve sobre como a sua "pessoa-muitas" dá "corpo ao poema - e vice-versa". E que beleza ler o verbete "Parentaia" ouvindo a canção "Cuitelinho" na voz de Milton Nascimento. Lançado no final 2025, DENDORÍ é livro que deve ocupar espaço importante na biblioteca de quem trabalha com performance, poesia e outras artes do signo verbal.
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