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03 março 2024

O avesso da pele


"Esta história é ainda a história de um ferida aberta. É uma história para me curar da falta daquilo que você, repentinamente, deixou de ser". Dirigidas ao pai, as palavras do narrador de O AVESSO DA PELE dão o ritmo do profundo e complexo embate com seus sentimentos, experiências e relações interpessoais. Passando sua formação em revista, o narrador faz um acerto de contas consigo mesmo, registrando o que é viver num país racista. Nesse processo a literatura (as leituras do pai e do narrador) é fundamental. O AVESSO DA PELE mostra que é possível aprender com a alteridade, ou, melhor, fazer da outra pessoa uma fonte de entendimento de si. É assim que São Petersburgo se espelha (reflete e refrata) em Porto Alegre, por exemplo, e Dostoiévski é companhia. Esse procedimento de revelar leituras é presença importante na obra de Jeferson Tenório, autor atento em propor e desenvolver uma educação antirracista em quem lê. "Pessoas brancas nunca pensam que um menino negro pobre possa ter outros problemas além da fome e das drogas", escreve o narrador. Jeferson Tenório ilumina por dentro aquilo que torna alguém o que esse alguém é, num jogo entre influenciar e se deixar influenciar pelos fracassos e sucessos. Como o professor Henrique Nunes, pai do narrador e morto porque "era alvo de uma política de Estado", como depõe um aluno. "É necessário preservar o avesso, você me disse. Preservar aquilo que ninguém vê. Porque não demora muito e a cor da pele atravessa nosso corpo e determina nosso modo de estar no mundo", lê-se num dos muitos trechos dirigidos ao pai, um pai cuja luta foi "fazer a sua voz permanecer na cabeça deles o máximo de tempo possível". Dos alunos, dos leitores, o livro O AVESSO DA PELE de Jeferson Tenório permanece.

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