Desde o Projeto 365 Canções (2010), o desafio é ser e estar à escuta dos cancionistas do Brasil, suas vocoperformances; e mergulhar nas experiências poéticas de seus sujeitos cancionais sirênicos.
05 novembro 2023
Tropicália rex
O rap abriu o debate a cerca da perda do reconhecimento confortável daquilo que definimos culturalmente ao longo de todo o século XX como sendo "canção" - monumento do gaio saber brasileiro. Entre o "ela pensa em casamento / e uma canção me consola" do verso tropicalista, o rap performa o "papo reto" de identidades historicamente postas à margem, sem o consolo, nem o direito. "O rap não é apenas um gênero da música popular brasileira que faz um jogo político; ele ressalta o jogo político que está presente desde os primórdios da tradição musical popular brasileira", escreve Liv Sovik no livro TROPICÁLIA REX. Para a autora, que trata do "fim de certo consenso pacífico em torno das hierarquias sociais e raciais" no Brasil, "o rap assume, exacerba e deixa explícito o que o tropicalismo preconizava em suas referências à cultura popular", agora, "não mais como motivo de choque, mas como veículo da vida coletiva", uma vida imersa na violência gerada pelas desigualdades. Quando, diante da audição de um rap, estranhamos e perguntamos "isso é canção?", o rap já cumpriu sua missão, ou seja, desinstalou a certeza, nublou as verdades burguesas, cravou a dúvida, deu o nó na orelha da nossa educação sentimental. TROPICÁLIA REX trata disso e de outras questões de música popular e cultura brasileira, temas sobre os quais Liv Sovik sempre lança luzes desautomatizadas.
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