13 junho 2015

26º Prêmio da Música Brasileira



O 26º Prêmio da Música Brasileira cumpriu a promessa de homenagear Maria Bethânia em seus 50 anos de ofício. A celebração reuniu cancionistas e atores - gente do palco, esse quintal de Bethânia - para percorrer a trajetória artística da "dona do dom", "diva das divas", como disse Alcione. Aliás, coube a Alcione quebrar o protocolo. A amiga de Bethânia contou um causo em que a alteza apareceu nossa demais, humanizada, despida das notícias de canonização com as quais até então - e por toda a noite - a festa a vestia. A homenageada corou e gargalhou junto com a plateia do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.
Fernanda Montenegro foi substituída por Juca de Oliveira para abrir a noite. O texto lido falou de voz, falava da voz e de sua dona, da dona da voz, da cantora autora que Bethânia é. Clássicos, mas distantes do laudatório vazio, o roteiro e o texto escritos por Zélia Duncan (compositora ainda não gravada por Bethânia) permitiram o assentamento bio-sonoro da homenageada. Zélia ajustou admiração e pesquisa, a fim de compor um panorama da rosa dos ventos cantada nesses 50 anos.
Visivelmente emocionada - emoção que perdurou toda a cerimônia -, Bethânia fez sua entrada. Errou a letra de "O Quereres" (Caetano Veloso), fez dengo de majestade e o público aplaudiu. Estava constituída assim a empatia entre ela e aqueles que ali estavam para bater a cabeça em devoção à musa-sereia.
Alguns números merecem destaque. Entre eles, o que juntou os compositores gravados por Bethânia no disco Âmbar (1996) Adriana Calcanhotto, Arnaldo Antunes e Chico César - três dos melhores de uma geração; o número passional que uniu a já citada Alcione - ovacionada após a interpretação arrebatadora de "Negue" (Adelino Moreira e Enzo Almeida Passos) -, Letícia Sabatella (com a declamação de "Quando o amor vacila") e Johnny Hooker que, vestido a la carcará, performou "Lama" (Paulo Marques e Alice Chaves); Nana e Dori Caymmi cantando "Pra dizer adeus" (Edu Lobo e Torquato Neto); Mariene de Castro evocando os orixás; Mônica Salmaso e Jackson Antunes revisando os temas rosianos e mariandradinos do disco Brasileirinho (2003); e Fabiana Cozza cantando com Roque Ferreira as canções deste gravadas por Bethânia. Além de Caetano Veloso que juntou "Queda d'água" e "É de manhã" para saudar a "presença toda sã" da mana no céu da canção nacional.
A interpretação de Matheus Nachtergaele para o trecho VIII de O guardador de rebanhos, de Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa), popularmente conhecido como "Poema do menino Jesus", coroou a noite constelar. E a gira festiva foi encerrada por Bethânia cantando "Explode coração" (Gonzaguinha) e, embalada por "Vento de lá" (Roque Ferreira), recebendo os convidados numa meia ciranda.
Numa festa com tamanha importância para a artista e para a Música Popular Brasileira, algumas ausências foram sentidas: Clarice Lispecto (citada en passant), Gal Costa (dupla doce bárbara de Bethânia) e, claro, Chico Buarque de Holanda. Jaime Alem, por sua vez, figurava na galeria do teatro. Gilberto Gil estava lá, mas subiu ao palco apenas para receber prêmio. Aliás, a festa elencou também excelentes amostras daquilo que tem sido feito na MPB de hoje. Apesar das confusas categorias de premiação.
De "Missa agrária" (Carlos Lyra e Gianfrancesco Guarnieri) e "Carcará" (João do Vale e José Cândido) a "Explode coração" (Gonzaguinha), a noite sagrou Maria Bethânia como A menina dos olhos de Oyá, a grande dama da canção, a que clareia o terreiro sonoro que o Brasil é, aquela que em sua trajetória luzidia en-canta no mau e no bom tempo.

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